quarta-feira, 21 de maio de 2014

Caracteristicas da poesia de Alberto Caeiro

Características:

·  Objectivismo
-   apagamento do sujeito
-   atitude antilírica
-   atenção à “eterna novidade do mundo”
-   integração e comunhão com a Natureza
-   poeta deambulatório


·  Sensacionismo
-   poeta das sensações tal como elas são
-   poeta do olhar
-   predomínio das sensações visuais (“Vi como um danado”) e das auditivas
-   o “Argonauta das sensações verdadeiras”


·  Anti-metafísico
(“Há bastante metafísica em não pensar em nada.”)
-   recusa do pensamento (“Pensar é estar doente dos olhos”)
-   recusa do mistério
-   recusa do misticismo


  Panteísmo Naturalista
-   tudo é Deus, as coisas são divinas (“Deus é as árvores e as flores/ E os montes e o luar e o sol...”)
-   paganismo
-   desvalorização do tempo enquanto categoria conceptual (“Não quero incluir o tempo no meu esquema”)
-   contradição entre “teoria” e “prática”


CARACTERÍSTICAS ESTILÍSTICAS
- Discurso em verso livre, em estilo coloquial e espontâneo. Proximidade da linguagem do falar quotidiano,  fluente, simples e natural;
- Pouca subordinação e pronominalização
- Ausência de preocupações estilísticas 
- Versilibrismo, indisciplina formal e ritmo lento mas espontâneo.  
- Vocabulário simples e familiar, em frases predominantemente coordenadas, repetições de expressões longas, uso de paralelismo de construção, de simetrias, de comparações simples.
- número reduzido de vocábulos e de classes de palavras: (dando uma impressão de pobreza lexical) pouca adjectivação, predomínio de substantivos concretos, uso de verbos no presente do indicativo (acções ocasionais)  ou no gerúndio. (sugerindo simultaneidade e arrastamento).
    Frases predominantemente coordenadas, uso de paralelismos de construção, de comparações simples
-   Verso livre
-   Métrica irregular
-   Despreocupação a nível fónico
-   Pobreza lexical (linguagem simples, familiar)
-   Adjectivação objectiva
-   Pontuação lógica
-   Predomínio do presente do indicativo
-   Frases simples
-   Predomínio da coordenação
-   Comparações simples
-   Raras metáforas



Alberto Caeiro
- Vê a realidade de forma objectiva e natural
- Aceita a realidade tal como é, de forma tranquila; vê um mundo sem necessidade de explicações, sem princípio nem fim; existir é um facto maravilhoso.
- Recusa o pensamento metafísico (“pensar é estar doente dos olhos”), o misticismo e o sentimentalismo social e individual.
- Poeta da Natureza
- Personifica o sonho da reconciliação do Universo, com a harmonia pagã e primitiva da Natureza
- Simples “guardador de rebanhos”
- Inexistência de tempo (unificação do tempo)
- Poeta sensacionista (sensações): especial importância do acto de ver
- Inocência e constante novidade das coisas
- Mestre de Pessoa e dos outros heterónimos
- Relação com Pessoa Ortónimo – elimina a dor de pensar
- Relação com Pessoa Ortónimo, Campos e Reis – regresso às origens, ao paganismo primitivo, à sinceridade plena

Os Maias - Simbolismo

Os Maias estão incrivelmente repletos de símbolos.
Afonso da Maia é uma figura simbólica - o seu nome é simbólico, tal como o de Carlos - o nome do último Stuart, escolhido pela mãe. Carlos irá ser o último Maia - note-se a ironia em forma de presságio.
No Ramalhete, esta designação e o emblema (o ramo de girassóis) mostram a importância "da terra e da província" no passado da família Maia. A "gravidade clerical do edifício" demonstra a influência que o clero teve no passado da família e em Portugal.
Por oposição, as obras de restauro, levadas a cabo por Carlos, introduziram o luxo e a decoração cosmopolita, simbolizam uma nova oportunidade, uma reforma da casa (ou do país) para uma nova etapa - é o reflexo do ideal reformista da Geração de Carlos. Carlos é um símbolo da Geração de 70, tal como o é Ega. Tal como o país, também eles caíram no "vencidismo".
No último capítulo, a imagem deixada pelo Ramalhete, abandonado e tristonho, cheio de recordações de um passado de tragédia e frustrações, está muito relacionado com o modo como Eça via o país, em plena crise do regime.
O quintal do Ramalhete, também sofre uma evolução. O fio de água da cascata é símbolo da eterna melancolia do tempo que passa, dos sentimentos que leva e traz. A estátua de Vénus que, enegrece com a fuga de Maria Monforte, no final a sua presença obscura na quintal é uma vaga premonição da tragédia. Ela marca o início e o fim da acção principal.
No quarto de Maria Eduarda, na Toca, o quadro com a cabeça degolada é um símbolo e presságio de desgraça. Os seus aposentos simbolizam o carácter trágico, a profanação das leis humanas e cristãs.
Também o armário do salão nobre da Toca, tem uma simbologia trágica. Os guerreiros simbolizam a heroicidade, os evangelistas, a religião e os trofeus agrícolas o trabalho: qualidades que existiram um dia na família (e no Portugal da epopeia). Os dois faunos simbolizam os dois amantes numa atitude hedonista e desprezadora de tudo e todos. No final um partiu o seu pé de cabra e o outro a flauta bucólica, pormenor que parece simbolizar o desafio sacrílego dos faunos a tudo quanto era excelso e sublimado na tradição dos antepassados.
No final, a estátua de Camões é o símbolo da nostalgia do passado mais recuado.
Não é difícil lermos o percurso da família Maia, nas alterações sofridas pelo Ramalhete. No início o Ramalhete não tem vida, em seguida habitado, torna-se símbolo da esperança e da vida, é como que um renascimento; finalmente, a tragédia abate-se sobre a família e eis a cascata chorando, deitando as últimas gotas de água, a estátua coberta de ferrugem; tudo tem um carácter funéreo. O cedro e o cipreste, são árvores que pela sua longevidade, significam a vida e a morte, foram testemunhas das várias gerações da família.
A morte instala-se nesta família. No Ramalhete todo o mobiliário degradado e disposto em confusão, todos os aposentos melancólicos e frios, tudo deixa transparecer a realidade de destruição e morte. E se os Maias representam Portugal, a morte instalou-se no país.
A Toca é o nome dado à habitação de certos animais, o que, desde logo, parece simbolizar o carácter animalesco do relacionamento de Carlos e Maria Eduarda. Na primeira vez que lá vão, Carlos introduz a chave no portão com todo o prazer, o que sugere o poder e o prazer das relações incestuosas; da Segunda vez ambos a experimentam - a chave torna-se, portanto, o símbolo da mútua aceitação e entrega.
Os aposentos de Maria Eduarda simbolizam o carácter trágico, a profanação das leis humanas e cristãs.
Os Maias estão também, povoados de símbolos cromáticos: a cor vermelha tem um carácter duplo, Maria Monforte e Maria Eduarda são portadoras de um vermelho feminino, despertam a sensibilidade à sua volta; espalham a morte. O vermelho é, portanto, o símbolo da paixão excessiva e destruidora.
O vermelho da vila Balzac é muito intenso, indicando a dimensão essencialmente carnal e efémera dos encontros de amor de Ega e Raquel Cohen
O tom dourado está também presente, indicando a paixão ardente; anunciando a velhice (o Outono), a proximidade da morte. Morte prefigurada pela cor negra, símbolo de uma paixão possessiva e destruidora.
Mãe e filha conjugam em si estas três cores: elas são, portanto, vida e morte, o divino e o humano, a aparência e a realidade, a força que se torna fraqueza.
Constatamos que a simbologia d'Os Maias possui uma função claramente pressagiosa da tragédia.

Os Maias - Linguagem e Estilo Queirosiano

Uma das preocupações de Eça foi evitar as frases demasiado expositivas, fastidiosas e pouco esclarecedoras dos românticos. Para tal, faz uso da ordem directa da frase, para que a realidade possa ser apresentada sem alterações, e empregou frases curtas para que os factos e as emoções apresentadas fossem transmitidas objectivamente.
A pontuação, na prosa queirosiana, não pretende servir a lógica gramatical. Eça põe a pontuação ao serviço do ritmo da frase para, por exemplo, marcar pausas respiratórias, para revelar hesitações ou destacar elevações de vozes.
Para evitar a utilização constante dos verbos declarativos, Eça criou o estilo indirecto livre.
 O processo consiste em utilizar no discurso indirecto a linguagem que a personagem usaria no discurso directo, ou seja no diálogo. Deste modo, o texto ganha vivacidade e evita a repetitiva utilização de disse que, perguntou se, afirmou que, ..., criando a impressão de se ouvir falar a personagem.
Eça de Queirós utiliza uma linguagem representativa não só da personalidade da personagem mas também de acordo com a sua condição social.
Como observador da sua sociedade, Eça teve de recriar nas suas obras as diferentes linguagens das diferentes classes sociais da sua época. Por isso, as suas obras tornam-se riquíssimos espólios e testemunhos da vida dos finais do século XIX.

OS MAIAS - o narrador

ž  O narrador é heterodiegético, ou seja, não é uma personagem da história.
ž  Assume, geralmente, uma atitude de observador.
ž  Marcas linguísticas: verbos na 3ª pessoa; pronomes e determinantes na 3ª pessoa; discurso indireto livre (nesta obra).
ž  O narrador omnisciente sabe tudo sobre as personagens: o seu passado, presente e futuro, bem como os seus sentimentos e desejos mais íntimos. É como um deus que tudo viu e tudo sabe. Verificamos que o narrador do romance conhece todo o passado dos Maias, sabendo mais sobre eles do que as próprias personagens. Isto permite-lhe arquitetar o romance, jogando com várias técnicas narrativas ao nível do tempo do discurso (por exemplo, a analepse).
ž  Um exemplo concreto do conhecimento do narrador relativamente à interioridade das personagens é o momento em que mostra conhecer os sentimentos que Afonso não expressa quando o filho, Pedro, surge perante ele, desesperado com a fuga da Monforte. (Final do cap. II – p. 44 – “Uma sombria tarde de Dezembro…”)
ž  ponto de vista, ou perspetiva narrativa, corresponde à adoção, por parte do narrador, de uma determinada posição para contar a história.
ž  Perspetivar a diegese de acordo com uma determinada focalização não é só ver a diegese por certos olhos; é tomar em relação a ela uma posição afetiva e/ou ideológica. Constituir-se-á assim uma imagem particular da história, configurada pela subjetividade da personagem que a perspetiva.
ž  N’Os Maias é fundamentalmente sobre Carlos que recai a focalização interna: as outras personagens dependem da sua visão do mundo e é a sua subjetividade que atua como elemento filtrante da realidade observada.
ž  A focalização interna valoriza o universo psicológico de Carlos e proporciona uma visão crítica da sociedade.
ž  ponto de vista de Carlos é sobretudo evidente nas passagens em que a obra nos dá a conhecer Maria Eduarda (o primeiro avistamento, o primeiro encontro,…). Aliás, parece ser na caracterização desta personagem feminina que o narrador mais abdica da sua omnisciência. Mas também existem outros exemplos da focalização interna de Carlos, como o jantar do Hotel Central ou o Passeio Final, em que a visão crítica da decadência do país é filtrada pelo olhar do protagonista.
ž Ao privilegiar a focalização interna, o narrador vê, sente e julga os eventos ficcionais com e como a personagem, o que, por outras palavras, significa que as leis da subjetividade da personagem condicionam a imagem da diegese que é veiculada.
ž  focalização interna adota por vezes a perspetiva de João da Ega. Um exemplo relevante deste ponto de vista são os episódios do jornal “A Tarde” e do Sarau no Teatro da Trindade.
ž  Outro exemplo digno de nota em termos de focalização interna, é o ponto de vista de Vilaça (pai), através do qual se apresenta a educação de Carlos em Santa Olávia.
ž  O narrador pode também optar pela focalização externa, ou seja, a simples referência aos aspetos exteriores da história contada: por exemplo, o aspeto físico das personagens, a sua vestimenta, ou os espaços físicos onde se movimentam.
ž  Esta atitude narrativa é especialmente empenhada na superficialidade e transmite, com objetividade, apenas aquilo que é observável.
ž  No entanto, n’Os Maias, a objetividade é, muitas vezes, apenas aparente. Assim, existem vários exemplos de utilização de adjetivos, de advérbios e de diminutivos que conferem subjetividade aos eventos narrados.
ž  Os exemplos que mais se destacam correspondem à descrição de Eusebiozinho ou à de Dâmaso. Encontramos aqui a focalização interventiva, com a função de comentário, aliada à adesão ou negação a/de comportamentos ou formas de estar das personagens. Pode ter uma função ideológica, por exemplo na apresentação da personagem Alencar, já velho, no jantar do Hotel Central.


Os Maias - Tempo

Por tempo do discurso entende-se aquele que se detecta no próprio texto organizado pelo narrador, ordenado ou alterado logicamente, alargado ou resumido.
Na obra, o discurso inicia-se no Outono de 1875, data em que Carlos, concluída a sua viagem de um ano pela Europa, após a formatura, veio, com o avô, instalar-se definitivamente em Lisboa.
Pelo processo de analepse, o narrador vai, até parte do capítulo IV, referir-se aos antepassados do protagonista (juventude e exílio de Afonso da Maia (avô), educação, casamento e suicídio de Pedro (pai), e à educação de Carlos da Maia e sua formatura em Coimbra) para recuperar o presente da história que havia referido nas primeiras linhas do livro. Esta primeira parte pode considerar-se uma novela introdutória que dura quase 60 anos. Esta analepse ocupa apenas 90 páginas, apresentadas por meio de resumos e elipses.
Assim, como vemos, o tempo histórico é muito mais longo do que o tempo do discurso.
Do Outono de 1875 a Janeiro de 1877 - data em que Carlos abandona o Ramalhete - existe uma tentativa para que o tempo histórico (pouco mais de um ano da vida de Carlos) seja idêntico ao tempo do discurso - cerca de 600 páginas - para tal Eça serve-se muitas vezes da cena dialogada.
O último capítulo é uma elipse (salto no tempo) onde, passados 10 anos, Ega se encontra com Carlos em Lisboa.

Os Maias - O Espaço

Nos 'Os Maias' podemos encontrar três tipos de espaço: o espaço físico, o espaço social e o espaço psicológico.

Espaço Físico
Exteriores
A maior parte da narrativa passasse em Portugal, mais concretamente em Lisboa e arredores.                                                
Em Santa Olávia passasse a infância de Carlos. É também para lá que este foge quando descobre a sua relação incestuosa com a irmã.                                                                                                     Em Coimbra passam-se os estudos de Carlos e as suas primeiras aventuras amorosas.                                                       
É em Lisboa que se dão os acontecimentos que levam Afonso da Maia ao exílio; é em Lisboa que sucedem os acontecimentos essenciais da vida de Pedro da Maia; e é também lá que decorre a vida de Carlos que justifica o romance - a sua relação incestuosa com a irmã.                                         
O estrangeiro surge-nos como um recurso para resolver problemas. Afonso exila-se em Inglaterra para fugir à intolerância Miguelista; Pedro e Maria vivem em Itália e em Paris devido à recusa deste casamento pelo pai de Pedro. Maria Eduarda segue para Paris quando descobre a sua relação incestuosa com Carlos. O próprio resolve a sua vida falhada com a fixação definitiva em Paris.                       
Deve referir-se como importante espaço exterior Sintra, palco de vários encontros, quer relativos à crónica de costumes, quer à relação amorosa dos protagonistas.

Interiores
Vários são os espaços interiores referidos n' Os Maias, portanto, destacamos os mais importantes.                                                            
No Ramalhete podemos encontrar: o salão de convívio e de lazer, o escritório de Afonso, que tem o aspecto de uma "severa câmara de prelado", o quarto de Carlos, "como um ar de quarto de bailarina", e os jardins.                                                                  A acção desenrola-se também na vila Balzac, que reflecte a sensualidade de João da Ega. É referido também na obra, o luxuoso consultório de Carlos que revela o seu diletantismo e a predisposição para a sensualidade.
A Toca é também um espaço interior carregado de simbolismo, que revela amores ilícitos. São ainda referidos outros espaços interiores de menor importância como o apartamento de Maria Eduarda, o Teatro da Trindade, a casa dos Condes de Gouvarinho, o Grémio, o Hotel Central os hotéis de Sintra, a redacção d' A Tarde e d' A Corneta do Diabo, etc.

Espaço Social
O espaço social comporta os ambientes (jantares, chás, soirés, bailes, espectáculos), onde actuam as personagens que o narrador julgou melhor representarem a sociedade por ele criticada - as classes dirigentes, a alta aristocracia e a burguesia.
Destacamos o jantar do Hotel Central, os jantares em casa dos Gouvarinho, Santa Olávia, a Toca, as corridas do Hipódromo, as reuniões na redacção d' A Tarde, o Sarau Literário no Teatro da Trindade - ambientes fechados de preferência, por razões de elitismo.           
O espaço social cumpre um papel puramente crítico.

Espaço Psicológico
O espaço psicológico é constituído pela consciência das personagens e manifesta-se em momentos de maior densidade dramática. É sobretudo Carlos, que desvenda os labirintos da sua consciência. Ocupando também Ega, um lugar de relevo.            Destacamos, como espaço psicológico, o sonho de Carlos no qual evoca a figura de Maria Eduarda; nova evocação dela em Sintra; reflexões de Carlos sobre o parentesco que o liga a Maria Eduarda; visão do Ramalhete e do avô, após o incesto; contemplação de Afonso morto, no jardim.                                                                     
Quanto a Ega, reflexões e inquietações após a descoberta da identidade de Maria Eduarda.                                                          
O espaço psicológico permite definir estas personagens como personagens modeladas.

O Menino da Sua Mãe

No plaino abandonado
Que a morna brisa aquece,
De balas trespassado-
Duas, de lado a lado-,
Jaz morto, e arrefece.
Raia-lhe a farda o sangue.
De braços estendidos,
Alvo, louro, exangue,
Fita com olhar langue
E cego os céus perdidos.
Tão jovem! Que jovem era!
(agora que idade tem?)
Filho único, a mãe lhe dera
Um nome e o mantivera:
«O menino de sua mãe.»
Caiu-lhe da algibeira
A cigarreira breve.
Dera-lhe a mãe. Está inteira
E boa a cigarreira.
Ele é que já não serve.
De outra algibeira, alada
Ponta a roçar o solo,
A brancura embainhada
De um lenço… deu-lho a criada
Velha que o trouxe ao colo.
Lá longe, em casa, há a prece:
“Que volte cedo, e bem!”
(Malhas que o Império tece!)
Jaz morto e apodrece
O menino da sua mãe
Fernando Pessoa
ANÁLISE DO POEMA
O poema foi inspirado numa litografia que observou numa pensão, onde, uma vez, jantou com um amigo.
É considerado uma obra-prima de visualidade poética e de impressionante intensidade dramática. 
O poeta presentificou o objeto, criando no leitor a ilusão de que descreve a litografia como se a tivesse diante dos olhos. 
O eu poético detém-se em pormenores impressionistas: a farda raiada de sangue, do jovem soldado morto, o seu olhar sem vida, a cigarreira, o lenço branco. O leitor tem a impressão de estar perante o «original» que todavia é a representação de uma cena real ou imaginada. 
O poeta descreve a cena, como se o seu olhar fosse uma câmara de filmar. São vários os enquadramentos: primeiro o lugar da «ação» – local de abandono e desolação, longínquo da mãe e da pátria do jovem soldado morto que, a pouco e pouco, arrefece e que, em breve, entrará em decomposição; depois numa aproximação e em grande plano, veem-se os buracos que as balas fizeram no corpo do jovem combatente, provocando-lhe a morte. Seguidamente, num processo de linguagem fílmica, a «câmara» foca o sangue que mancha a farda e os braços estendidos, vazios de vida, presentificando no leitor-espetador a ideia da morte. A cor branca da pele, o cabelo louro, o olhar parado a fitar «os céus perdidos» remetem para as relações iniciais de afastamento da terra natal, dos entes queridos, do abandono a que foi votado em terras distantes, onde foi defender o Império e ainda a sua perdição total e irremediável – a morte. A «câmara» desce e focaliza os objetos pessoais – a «cigarreira breve», o «lenço branco»; objetos de forte carga afetiva, símbolos de um corte dramático num ciclo de vida (a adolescência deu lugar à vida adulta), tão abruptamente interrompido. 
Ora, a magistral arte criadora do poeta reside na história (tempo passado) do «menino de sua mãe», no que se passava lá longe no seu lar, pois que a litografia contava tão-somente a desgraça que aniquilara o jovem herói que morrera num campo de batalha. 
O poema revela um equilíbrio perfeito entre o descritivo e o narrativo, observando-se o presente (que se justifica pela descrição de uma litografia cuja centralidade é ocupada por um herói já morto, mergulhado na intemporalidade) e o pretérito, tempo exigido pela narração. 
Uma leitura simbólica poderia reenviar o leitor para a experiência dramática do poeta ao passar da sua infância adolescência para a vida adulta. Estaria Fernando Pessoa (que perdera a mãe há tão pouco tempo) a projetar-se no jovem soldado morto, chorando sobre si mesmo, sobre o «menino de sua Mãe» que irremediavelmente «jazia» morto? 

Características da poesia de Ricardo Reis


Ricardo Reis, heterónimo de Fernando Pessoa, é o poeta clássico, da serenidade epicurista, que aceita, com calma lucidez, a relatividade e a fugacidade de todas as coisas. “Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio”, “Prefiro rosas, meu amor, à pátria” ou “Segue o teu destino” são poemas que nos mostram que este discípulo de Caeiro aceita a antiga crença nos deuses, enquanto disciplinadora das nossas emoções e sentimentos, mas defende, sobretudo, a busca de uma felicidade relativa alcançada pela indiferença à perturbação.A filosofia de Ricardo Reis é a de um epicurismo triste, pois defende o prazer do momento, o “carpe diem”, como caminho da felicidade, mas sem ceder aos impulsos dos instintos. Apesar deste prazer que procura e da felicidade que deseja alcançar, considera que nunca se consegue a verdadeira calma e tranquilidade – ataraxia.Ricardo Reis propõe, pois, uma filosofia moral de acordo com os princípios do epicurismo e uma filosofia estóica:- “Carpe diem” (aproveitai o dia), ou seja, aproveitai a vida em cada dia, como caminho da felicidade;- Buscar a felicidade com tranquilidade (ataraxia);- Não ceder aos impulsos dos instintos (estoicismo);- Procurar a calma, ou pelo menos, a sua ilusão;- Seguir o ideal ético da apatia que permite a ausência da paixão e a liberdade (sobre esta apenas pesa o Fado).
·  Epicurismo-   busca da felicidade relativa-   moderação nos prazeres-   fuga à dor-   ataraxia (tranquilidade capaz de evitar a perturbação)- prazer do momento- Carpe Diem (caminho da felicidade, alcançada pela indiferença à perturbação)- Não cede aos impulsos dos instintos- calma, ou pelo menos, a sua ilusão- ideal ético de apatia que permite a ausência da paixão e a liberdade

·  Estoicismo : considera ser possível encontrar a felicidade desde que se viva em conformidade com as leis do destino que regem o mundo, permanecendo indiferente aos males e às paixões, que são perturbações da razão-   aceitação das leis do destino (“... a vida/ passa e não fica, nada deixa e nunca regressa.”)-   indiferença face às paixões e à dor-   abdicação de lutar-   autodisciplina
·  Horacianismo-   carpe diem: vive o momento-   aurea mediocritas: a felicidade possível no sossego do campo (proximidade de Caeiro)

·  Paganismo-   crença nos deuses-   crença na civilização da Grécia-   sente-se um “estrangeiro” fora da sua pátria, a Grécia

·  Neoclassicismo-   poesia construída com base em ideias elevada-   Odes (forma métrica por excelência)

CESÁRIO VERDE (bibliografia)

1855: A 23 de Fevereiro, num prédio da Rua da Padaria (junto à Sé de Lisboa), nasce José Joaquim CESÁRIO VERDE, filho de Maria da Piedade dos Santos Verde e de José Anastácio Verde. – 1857: Peste em Lisboa; a família Verde refugia-se na sua quinta de Linda-a-Pastora. – 1865: Os Verde passam a morar na Rua do Salitre (Lisboa). Cesário conclui a instrução primária e começa a estudar inglês e francês. – 1872: Cesário começa a trabalhar na loja de ferragens do pai, na Rua dos Fanqueiros. Com 19 anos, tuberculosa, morre Maria Julia, irmã de Cesário. – 1873: Cesário matricula-se no Curso Superior de Letras, onde conhece e se torna grande amigo do escritor Silva Pinto. Publica os seus primeiros poemas no Diário de Notícias. – 1874: Publica mais poemas no Diário de Notícias (Lisboa) e nos jornais do Porto Diário da Tarde e A Tribuna. Ramalho Ortigão crava-lhe uma Farpa a propósito do poema Esplêndida. Boémia revolucionária no “Martinho”. – 1875: Cesário conhece e faz amizade com Macedo Papança (futuro conde de Monsaraz). Continua a publicar poemas no Mosaico (Coimbra), n’A Tribuna e n’O Porto. Começa a dirigir a loja da Rua dos Fanqueiros e a quinta de Linda-a-Pastora. – 1876: Desenvolve negócios. Frequenta a casa de Papança, na Travessa da Assunção, onde se cruza com Guerra Junqueiro, Gomes Leal e João de Deus. Os Verde mudam-se para a Rua das Trinas. – 1877: Volta a colaborar no Diário de Notícias. Queixa-se dos primeiros sintomas de tuberculose. – 1878: Passa a viver em Linda-a-Pastora. Nos jornais publica Noitada, Manhãs Brumosas, Em Petiz. – 1879: Publica Cristalizações no primeiro número da Revista de Coimbra. É atacado pela republicana Angelina Vidal n’A Tribuna do Povo e pelo monárquico Diário Ilustrado. – 1880: Publica O Sentimento dum Ocidental no número do Jornal de Viagens (Porto) dedicado ao tricentenário de Camões. Os Verde exportam maçãs para Inglaterra, Alemanha e Brasil. – 1881: Cesário participa no “Grupo do Leão” e convive com Abel Botelho, Alberto de Oliveira, Fialho de Almeida, Gualdino Gomes e com os pintores José Malhoa, Silva Porto, Columbano e Rafael Bordalo Pinheiro. – 1882:  Morre, tuberculoso, Joaquim Tomás, irmão de Cesário. – 1883: Cesário viaja para França, numa tentativa malograda de exportar vinhos portugueses. – 1884: Publica Nós. Deixa de frequentar os meios literários. Activa negócios, produz, compra e exporta frutas. Recolhe-se a Linda-a-Pastora. – 1885: Agrava-se o seu estado de saúde mas regressa a Lisboa e continua a trabalhar na loja da Rua dos Fanqueiros. – 1886: Extremamente doente, instala-se em Caneças. Vai depois para casa de um amigo, no Lumiar (às portas de Lisboa), onde vem a morrer a 19 de Julho. – 1887: Silva Pinto edita O Livro de Cesário Verde.