quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Titulo da Obra "Felizmente ao luar"


O título é o primeiro contacto que o leitor tem com a obra. Este pode, de imediato, dar pistas para a leitura da obra ou ser de tal forma hermética que não é possível descodificar numa primeira leitura de superfície.Felizmente Há Luar! é um título verbal e sendo uma frase exclamativa remete para a possibilidade de ter sido pronunciada por alguém e de fazer parte do todo que é a obra. Resta, contudo, a dúvida: quem a pronunciou, quando e em que contexto?
Através da leitura do texto de Raul Brandão, Vida e morte de Gomes Freire, verifica-se que este título comporta consigo verdade histórica pois está presente num documento escrito por D. Miguel Forjaz ao Intendente Geral da Polícia, no dia 18 de Outubro de 1817, como abaixo se transcreve:

"É verdade que a execução se prolongará pela noite mas felizmente há luar e parece-me tudo tão sossegado que espero não cause isso prejuízo algum."

Sttau Monteiro tranformou esta afirmação em exclamação e colocou-a como título da sua peça. Deturpou a História? Não, pois com a leitura da mesma verifica-se que é na boca de quem realmente as pronunciou que estas palavras aparecem pela primeira vez:

"D. Miguel - É verdade que a execução se prolongará pela noite, mas felizmente há luar..."

Já no final da peça esta expressão é colocada na boca de Matilde. Agora, porém, aparece reforçada pela repetição do advérbio de modo e pelo tom exclamativo conferido pela pontuação:

"Matilde: - Felizmente - felizmente há luar!"

Desta vez, não se trata de uma verdade histórica, pois não consta que Matilde tivesse pronunciado tais palavras. São, contudo, estas que vão ser recuperadas pelo autor para dar título à obra. Com que intenção o terá feito?
Apesar de idênticas, proferidas por personagens de universos distintos, veiculam mensagens diferentes. Na voz de D. Miguel pretendem funcionar como um aviso a todos aqueles que ousam desacatar a ordem. Na voz de Matilde são um grito de esperança para que o povo continue a lutar contra as injustiças de que é alvo.
O facto de Sttau Monteiro ter colocado esta expressão no final da peça não se deve ao acaso. Com isso pretende não só transmitir uma mensagem de esperança como também confere uma certa circularidade à obra.
A morte de Gomes Freire não é um fim mas o início de uma nova era.

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